quarta-feira, 13 de maio de 2009

A Lira dos Cem Anos



Tenho dúvidas... Tenho tantas dúvidas!
Pelo número de todos os fracassos que coleciono em minha alma, sou mais que uma pessoa jovem, de vinte e três anos; sou menos que uma pessoa jovem de vinte e três anos.
Coisas inomináveis se apossam de minha mente, sempre de maneira tão súbita, sempre de maneira tão abstrata, sempre fazendo com que tudo vire nada e aumentando a vontade inconsequente de abrir mão desse nada, que é tudo que tenho.
Minha "lira" que embeleza à vida está sem cordas, enferrujada e com vermes horrendos ao redor. Não só a minha, mas a lira do mundo está pútrida. E fede, essa lira. A música incomoda tanto quanto o fedor. São apenas ruídos misturados ao cheiro ruim atormentando todos os que conseguem vê-la, senti-la e ouvi-la.

Tenho dúvidas... Será que tudo isso é verdade? Mas o que é "verdade"? Se não há nada de absoluto então não há verdade alguma. Só resta a dúvida eterna e o cheiro desagradável e enlouquecedor do som da lira dos cem anos presentes em meus vinte e três.

Ah, que saudades de minha juventude! Podem rir de mim os que só enxergam o palpável. Aqueles que tiverem a capacidade de navegar nas profundezas de meus olhos, poderão notar como sou velho. Velho e cansado... Muito cansado. Cansado de que? De ouvir repetidas canções que sempre terminam; de tentar extrair ruído de paz duma lira podre. O cansaço do mundo é forte, e atormenta. "Sempre existe algo ausente, que atormenta". O que me falta é vida, ânimo, beleza, verdade... Me falta o mundo e sua cegueira coletiva. Se todos enxergassem o quão inútil e ridiculo é esse "espetaculo" vivandis, provavelmente já haveriam desistido de batalhar por um futuro que não existe. É tudo o agora, e o agora é nada. O Agora é a dúvida eternamente sem resposta, é a velhice de quem não sente mais prazer em degustar o sabor de alegrias e tristezas.
Ah, que saudade de minha juventude! Quando poucos eram os destroços dentro de mim; quando tudo era construções, apenas construções de sonhos desmoronáveis.

Hoje, agora, o tempo real me faz acreditar que sonhos de areia não conseguem permanecer em nossas mãos quando o vento insiste em soprar, não para refrescar, mas para desmoronar, destruir, acabar. Sim! Acabar! Queimar a lira maldita e viver em um universo mudo. Nada é mais doce que a melodiosa canção do silêncio. O vento não queima o instrumento que embala a vida. Isso é preciso ser feito por mim mesmo. Como?... Meu corpo arde ao pensar; minha mente estremece; mas minha alma permanece fria, congelante a tal ponto que toca o coração... O coração derrete o gelo com suas lembranças, suas melódias que há tanto tempo não são mais escutadas. A alma quer beijar a morte, mas o cansado coração insiste em tirar alguma nota harmoniosa da lira tão velha. Ele, o coração, falha. O frio é mais forte e o fedor da música também.

Maldita velhice de minha alma! Que ela morra de uma vez, junto a tudo aquilo que faz com que a lira dos cem anos continue a tocar sua música moribunda! Talvez assim, com a alma morta, ainda haja esperança fria ao meu coração vazio. Talvez assim eu viva por viver, sem buscar respostas nem dúvidas...
De que adianta tudo isso??? De que importa minha idade? De que importa a lira, as notas, o peito, a alma? Está tudo apodrecendo. Breve haverá um nada ainda maior que o de agora. Breve haverá o pó... E como ninguém aguenta escutar ruídos de uma lira sem vida, ninguém terá vontade de levar flores para animar simbolicamente o túmulo que não terei. Ninguém lembrará dessas palavras torpes. Ninguém saberá que existi.
Eu existi? Nós existimos? Não... definitivamente não. O hoje já acabou e ninguém existe amanhã. Eu nunca existi. Não há quem tenha existido.

5 comentários:

isadora_gbi_ disse...

às vezes o que você escreve me assusta um pouco. me faz querer te abraçar e te mostrar que não, a vida não é assim tão triste e crua e ainda que seja, temos sempre a oportunidade de reinventá-la, tentar fazer diferente, a cada dia. e para isso você pode contar comigo. ;*

Non Omnis Moriar disse...

às vezes eu me assusto comigo mesmo. rs...
Só você tem o dom de tornar nulo tudo que me impulsiona à frialdade mórbida de meu caótico interior.
Por causa de você (re)acredito no Amor.

Isabel Moreira Rego disse...

Eu espero amigo, que os teus textos sejam mesmo "devaneios vazios", porque ao não serem o meu amigo é uma pessoa triste e sem esperança na vida. Nem tudo é tão mau assim. Pensa só que se não tivesses nascido não conhecias os maus e nem os bons momentos. Olhar o céu pelas manhãs ao acordar, olhar e ouvir o mar, olhar à noite as estrelas brilhando no céu, ouvir os pássaros cantar, estar com a família e com amigos. Não achas que vale apena viver, ainda que seja só para existir? E meu amigo não quero saber que esas triste. Vá lá! Amanhã é outro dia.
jinhos
da miginha
Isa

Isabel Moreira Rego disse...

Quando escrevi o 1º comentário não tinha ainda lido todo o teu texto. Depois de o ter lido compreendi que tu afinal és um poeta. O teu texto , não é mais nem menos que um lindo texto poetico e muito bem escrito. Queres um conselho amigo? Escreve um livro.
Jinhos
Isa

Non Omnis Moriar disse...

Obrigado pelos elogios, Isa.
Ainda sou deveras imaturo na escrita para escrever um livro e, além do mais, minha finalidade é apenas expurgar coisas que se confundem dentro do caos de minh'alma. E, sim, claro. Cada amanhecer é um novo renascer àqueles que almejam viver intensamente cada segundo do presente.
Bjs pra você!

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